FISCAIS QUE NÃO FISCALIZAM - Editorial Zero Hora 16/01/2011
Dorme na gaveta do procurador-geral da República desde abril do ano passado uma representação feita pela Associação Nacional do Ministério Público de Contas (Ampcon) pedindo o fim das nomeações políticas para os cargos de conselheiros dos tribunais de contas estaduais. Na ocasião, representantes da entidade e da Ordem dos Advogados do Brasil mapearam as indicações fisiológicas e comprovaram o aparelhamento político das cortes fiscalizadoras por partidos e governadores. Tocaram, assim, na maior deformação dos organismos criados para auxiliar no controle da administração pública, que é o comprometimento de seus integrantes com causas partidárias ou com o governante que os nomeia. Infelizmente, esta mesma mazela se reproduz em outros órgãos fiscalizadores, notadamente nas agências reguladoras de serviços públicos concedidos, cujos conselheiros são igualmente nomeados pelos governantes.
No caso dos TCs, que são regulados por dispositivos constitucionais, a questão central é exatamente o descumprimento dos requisitos exigidos para as nomeações. De acordo com o artigo 73 da Constituição Federal, ministros do Tribunal de Contas da União e conselheiros dos tribunais estaduais devem ter idoneidade moral e reputação ilibada comprovadas, além de notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública. Na prática, esses critérios são desconsiderados. Os indicados por acordos políticos e interesses partidários submetem-se a uma sabatina de faz de conta nos parlamentos, invariavelmente protagonizada por ex-companheiros de casa. Contam-se nos dedos, se existirem, os casos de rejeição de pretendentes ao cargo.
No abrigo da incúria de quem deveria exigir conhecimento técnico dos futuros fiscais, já ingressaram nas cortes de conta irmãos, filhos e esposas de governadores. Que isenção têm essas pessoas para examinar e julgar a administração do padrinho? Também pelos parlamentares têm passado, com indesejável frequência, candidatos indiciados em investigações criminais. Em abril do ano passado, quando a Ampcon recorreu ao procurador-geral da República, tramitavam no Superior Tribunal de Justiça 54 inquéritos e ações contra 32 conselheiros de tribunais de contas de 17 Estados. E a idoneidade moral? E a reputação ilibada?
O apadrinhamento político, infelizmente, também compromete a eficiência das agências reguladoras, criadas para fiscalizar as concessionárias de serviços públicos privatizados. Esses organismos têm como atribuição prioritária a defesa dos interesses dos cidadãos. Conceitualmente, são autarquias especiais independentes do Poder Executivo. Mas, em muitos casos, estão transformadas em cabides de emprego para apaniguados, que recebem verdadeiras sinecuras como recompensa por serviços prestados aos governantes que os nomearam. Que autonomia pode ter um órgão de controle integrado por fiscais subservientes?
Evidentemente, tanto nas cortes de conta quanto nas agências reguladoras existem conselheiros íntegros e conscientes de suas obrigações. Porém, também estes acabam tendo suas ações prejudicadas pelo voto de colegas comprometidos com interesses políticos. Diante desta situação, é impositivo que a Procuradoria-Geral da República dê andamento à representação do MP e que o Poder Legislativo inclua a revisão do processo de nomeações em sua pauta, para que a Constituição seja efetivamente observada.
O leitor concorda
Como presidenta da Associação dos Servidores do TCE-RS, cumprimentamos o jornal ZH pela escolha do tema, que tem sido uma das bandeiras do nosso corpo técnico. Com o auxílio da mídia, nossa luta foi levada ao conhecimento da sociedade em 2009, tendo em vista a abertura de duas vagas para conselheiro no RS. Apresentamos, à época, Associação e Centro de Auditores, ao Legislativo gaúcho, regulamento do processo de escolha, o qual permitirá aferir a qualidade técnica e o compromisso dos candidatos com o interesse público. Buscamos dar concretude ao modelo constitucional vigente, ou seja, todo cidadão brasileiro que preencha os requisitos constitucionais pode ser candidato ao cargo. O trabalho de Controle Externo que a sociedade espera passa necessariamente pelo aperfeiçoamento dos TCs, e a revisão das escolhas políticas é um dos temas centrais, senão, o principal. Esperamos que o parlamento dê curso ao debate e revise o processo de escolha, pois trata-se de tema público relevante. Ligia Zamin – Porto Alegre (RS)
Além de ser vergonhosa a indicação política, acaba desmoralizando o próprio tribunal, que deveria ser isento e técnico, pois está fiscalizando a aplicação dos recursos de todo o povo e não de determinados partidos. O mandato dos conselheiros também não deveria ser eterno, e sim por tempo determinado, pois se ficarem muito tempo também acabam criando um vínculo entre eles e criam tendências que não contribuem para a lisura que o tribunal deve manter. Aldair Paulo Pasquetti – Ronda Alta (RS)
Pelo que sei de amigos, de um lado existem auditores concursados empenhados em levantar corrupção e desvios de dinheiro; de outro lado, os conselheiros (ex-deputados) arquivando tudo. Não há transparência dos processos. Os conselheiros acobertam tudo, toda a maracutaia de seus colegas de partido da ativa. Edson Schneider Poleto – Esteio (RS)
Parabéns pela importante abordagem. Sob o postulado institucional, acredito que os tribunais se enfraquecem de forma desmesurada quando parte de seus agentes ascende ao cargo pela via indireta. Indireta porque é notório que servidor público deve ser nomeado através de prévio concurso. Como cidadão, jamais concebi e muito menos entendi que um dos mais importantes braços da administração pública, que são os órgãos de auditoria e fiscalização, pudessem não ser exclusivamente técnicos. É um dos grandes contrassensos da nossa República. Se avaliarmos os índices de aprovação e rejeição das instituições brasileiras, concluiremos que os políticos, nossos legisladores, deveriam impor-se severa autocrítica, inclusive abdicando de privilégios e isenções. Talvez a grande mídia pudesse fomentar e impulsionar debate de tamanha relevância. Só ela tem o ímpeto e força continuada para mobilizar a opinião pública. Basta de ingerência política nos tribunais do meu país.
Gilberto Rohleder – Cândido Godói (RS)
Concordo com o editorial de ZH. A nomeação de associados políticos para a gestão de órgãos técnicos é o câncer que consome a administração pública brasileira. Acredito que a imprensa deveria cobrar mais fortemente que institutos como a lista tríplice com servidores de carreira fossem utilizados para esses cargos, ficando os chefes de Executivo limitados a indicar seus subordinados diretos. Rafael Bittar da Silva - Porto Alegre - RS
O leitor discorda
Até o fechamento desta edição, na noite de sexta-feira, nenhum leitor havia discordado dos argumentos utilizados no editorial.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - A atribuição de fiscalizar as contas públicas é do parlamento. Como este declinou, defendo a criação de um sistema de ordem fiscal e tributária extruturado por vara judicial, promotoria criminal, defensoria e uma polícia fiscal tributária, autônoma, independente e auxiliar da justiça tributária. Os tribunais de contas seriam extintos.
A ganância do Estado brasileiro produz arrecadações recordes em impostos oriundas de taxas abusivas cobradas do trabalhador, gastas para manter a máquina pública mais cara do planeta e desperdiçadas em obras superfaturadas, salários extravagantes, farras, privilégios e assistencialismo sem contrapartidas, em detrimento de serviços, direitos e garantias devidas a todo o povo brasileiro.
PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA TRIBUTÁRIA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL - Art.150, § 5º - A lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços.
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