EDITORIAL O GLOBO, 16/06/2011 às 18h37m
A notória ineficiência estatal, refletida na incapacidade de Brasília fiscalizar a lisura na aplicação do dinheiro do contribuinte, não para de ter exemplos. O mais recente, relatado em reportagem do GLOBO, envolve indícios do uso de Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips) no desvio de recursos do Tesouro.
Entidades sem fins lucrativos chanceladas pelo Ministério da Justiça para serem contratadas por governos na prestação de serviços à população, Oscips têm sido usadas para o acesso fácil a recursos públicos, a serem gastos sem a devida prestação de contas. De acordo com os registros do Tribunal de Contas da União (TCU), há R$ 120 milhões em despesas executadas por meio destes organismos sem que se saiba como e onde a cifra foi aplicada.
Há uma ironia: as Oscips foram criadas em 1999 com o objetivo de corrigir falhas de fiscalização constatadas na contratação de organizações não governamentais. O simples fato de políticos com folha corrida de fichas-sujas passarem a atuar atrás do biombo de ONGs já indicava a deturpação deste instrumento ágil de auxílio à administração pública.
Foi emblemática a denúncia de que o senador sem voto (suplente de Joaquim Roriz) Gim Argello (PTB-DF) destinara emendas parlamentares para uma ONG de amigos. Os desmentidos foram veementes, mas, por precaução, Argello, da base governista, renunciou à relatoria do Orçamento deste ano, e mergulhou para tentar fugir do noticiário.
Sinal estridente de que algo vai mal é a oferta pública, noticiada pelo jornal, de venda de entidades a quem se interessar pela captação de verbas públicas. Há pregão até de Oscip já proprietária de verbas. Pelo jeito, o registro no Ministério da Justiça é pro forma e serve para criar mais um cartório, dos tantos em funcionamento no universo estatal.
Tem-se a sensação de absoluto descaso com o destino da arrecadação dos pesados impostos. Assim como houve desvirtuamentos com ONGs, o mesmo parece acontecer com Oscips, em prejuízo de um modelo que tem sido aplicado com bons resultados, por exemplo, na área de saúde pública.
Nos últimos dez anos, a extração tributária escalou dez pontos de PIB e hoje está na faixa dos 36% do produto interno, mais do que em várias economias desenvolvidas e recorde no bloco dos emergentes. Algo como mais de 100 mil funcionários públicos foram contratados, mas a fiscalização continua a dar seguidas demonstrações de ineficácia. Não empregaram fiscais, pelo visto.
A Controladoria-Geral da União (CGU), diante de 5.564 prefeituras, faz auditorias por amostragem, e sempre descobre grande número de fraudes. Os casos são remetidos ao Ministério Público, processos entram no labirinto do Judiciário, e de lá não se sabe quando sairão.
Onde há muito dinheiro existe algum esquema em funcionamento para desviar o que for possível. Como a fiscalização é débil, tudo fica mais fácil. Se apenas 2,5% dos repasses bilionários da União para a Saúde em estados e municípios são auditados, não deve ser difícil capturar algo nos 97,5% restantes. Pois só nestes 2,5% investigados encontraram-se desvios de R$ 662 milhões. A história das Oscips dá a entender que é eterna esta farra nos cofres públicos.
A ganância do Estado brasileiro produz arrecadações recordes em impostos oriundas de taxas abusivas cobradas do trabalhador, gastas para manter a máquina pública mais cara do planeta e desperdiçadas em obras superfaturadas, salários extravagantes, farras, privilégios e assistencialismo sem contrapartidas, em detrimento de serviços, direitos e garantias devidas a todo o povo brasileiro.
PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA TRIBUTÁRIA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL - Art.150, § 5º - A lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços.
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