PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA TRIBUTÁRIA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL - Art.150, § 5º - A lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços.

quarta-feira, 16 de março de 2011

AS DISTORÇÕES TRIBUTÁRIAS DO BRASIL

João Luiz Coelho da Rocha - Artigo do leitor - O GLOBO, 15/03/2011


Um interessante artigo do jornalista Carlos Alberto Sardenberg, publicado em O GLOBO, apresenta uma apreciação significativa sobre a distorção existente na cobrança do ICMS, e também da COFINS/PIS "por dentro", ou seja, incidindo sobre seu próprio valor. A sarabanda de números é tão contorcida que nos serviços de energia elétrica e de telefonia o tributo estadual chega a quase 50 % do preço efetivo do comerciante/prestador.

O ICMS, que na sua tipificação constitucional incide sobre a circulação econômica de bens e sobre serviços de comunicação e de transporte, estes quando estendidos para além do limite municipal, deferiu à Lei Complementar no artigo 155, XII "i" fixar a base de cálculo do imposto, sendo que ali por força de Emenda Constitucional aprovada em 2001 expressou-se que o montante do imposto também integre tal base.

A Emenda Constitucional de 2001 veio para acobertar (criando a alínea "i" do $ 2º, inciso XII do art.155) o que a Lei Complementar 87/96 já ditava, sobre o cálculo por dentro do ICMS. Pois então, há hoje assento constitucional formal para essa aberração moral, ética e mesmo jurídica, que é um imposto incidindo sobre ele mesmo, o que no fundo é um meio de expressar que a alíquota do imposto, cálculo do montante a ser pago pelo contribuinte, não é ao fim aquela expressa na lei, mas uma maior.

Esta manobra constitucional, fruto da famosa voracidade fazendária representa na verdade um verdadeiro estelionato tributário contra os contribuintes brasileiros.

O Fisco é o único credor que detém o poder de editar as regras sobre seus créditos. Nenhum credor, bancário, comercial, trabalhista, comum, detém essa força desequilibradora nas suas relações obrigacionais. Todos se submetem às leis que balizam e muitas vezes limitam ou tornam nulas cláusulas contratuais. Isso não acontece com a Fazenda Pública, que, nas três esferas da Federação representam a voz do credor tributário o Poder Público, enquanto este mesmo credor edita as leis e decretos sobre tributação.

Mas assim agindo, desfrutando de seu poder legisferante, não pode o Fisco, sob o ponto de vista moral, ético e jurídico no seu substrato mais consistente, usar de "tornures" conceituais para aumentar seus tributos.

Adotar como conceito que o ICMS incide sobre o valor da circulação do bem ou da prestação do serviço considerando-se este como a montante global já embutido o próprio ICMS é perverter o paradigma constitucional como configurado. Pois, na verdade, o preço (do produto, do serviço) é aquele que o contribuinte alcança para seu comércio e só aí então incide o ICMS. Ninguém considera seu preço economicamente composto embutindo desde o início o ICMS. O comerciante calcula o valor que compense a venda de seu produto ou serviço e a partir dali aplica e calcula o imposto a ser debitado.

Esse artifício sofístico que a Lei Complementar utiliza com base hoje na malfadada inserção daquele inciso constitucional, acarretando uma distorção substancial no custo do tributo, só proporciona e estimula de volta a atitude do contribuinte de recorrer à sonegação, comportamento que não se espera de um exercício de cidadania das pessoas corretas. Pois com o uso desse estratagema conceitual formal o Poder Público perde a moral para demandar condutas corretas dos contribuintes.

O conceito da Lei Complementar, depois satisfeito naquela emenda constitucional, é ademais dotado de um grande ilogismo, e de uma contradição em termos, pois o ICMS não pode incidir sobre seu próprio valor, dado que neste ato ele ainda não terá incidido. O comerciante fixa seu preço e, na hora de despachar a mercadoria, o serviço, ele calcula o ICMS e exatamente no instante deste calculo (e lançamento) o ICMS ainda não incidiu, não podendo ser levado em conta naquele cálculo.

O Poder Judiciário, atado a esta insidiosa formalização do assunto na Lei Maior e na Lei Complementar, tem decidido pela validade jurídica da incidência "por dentro" do ICMS. Conta-se e espera-se que amadurecendo mais a apreciação deste fenômeno, o STF reveja o entendimento, e considere que nem uma emenda constitucional e decerto nem a Lei Complementar podem afrontar o conceito básico subjacente ao artigo 155, II da Carta, pois que as operações de circulação de bens bem como as prestações de serviços ali referidas são hipóteses de incidência que adstringem o legislador a fixar uma base de cálculo justa, efetiva, real, dizendo com o preço calculado pelo comerciante antes que o mesmo imposto venha incidir.

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