ZH 31 de outubro de 2014 | N° 17969
CAIO CIGANA
ECONOMIA PÓS-ELEIÇÕES
BOVESPA SOBE E DÓLAR RECUA após alta inesperada da taxa de juro. Próximo passo do governo deverá ser um forte ajuste fiscal para diminuir gastos públicos, reduzindo os investimentos, e ampliar a arrecadação. Combustíveis podem subir hoje
O primeiro movimento do Banco Central (BC) após a reeleição da presidente Dilma Rousseff parece o início de uma tentativa do Planalto de agora buscar um voto de confiança do mercado. Na busca pela reaproximação, a surpreendente alta de 0,25 ponto percentual da Selic na quarta-feira, levando o juro básico da economia para 11,25% ao ano, fez ontem o dólar cair com força e a bolsa fechar com avanço expressivo.
A decisão do BC foi interpretada por economistas e agentes do setor financeiro como um sinal de que, a partir de agora, a prioridade é recuperar a credibilidade, começando pelo controle da inflação.
– O governo tentou criar a percepção de que, neste segundo mandato (de Dilma), terá uma política econômica mais ajustada e que vai fazer o necessário para fazer a economia voltar aos trilhos – avalia a economista Alessandra Ribeiro, da Tendências Consultoria, lembrando que a alta foi inesperada não por ser desnecessária, mas porque não foi indicada pelo BC.
Como a pressão inflacionária tende a permanecer em 2015, puxada principalmente pelo represamento de preços administrados, a tendência é de novas altas no juro básica. A medida é considerada necessária, apesar de reduzir ainda mais o lento ritmo de retomada da atividade econômica, após dois trimestres de PIB negativo que jogaram o Brasil em uma recessão técnica.
– Combustíveis, tarifas de ônibus e metrô que ficaram meio congeladas, energia, tudo isso vai gerar pressão. Devido à seca, a energia vai subir acima da inflação – alerta Emerson Marçal, professor de macroeconomia da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Para o flerte continuar a ser correspondido, porém, o mercado espera mais iniciativas. A próxima pode ser um aumento do preço da gasolina a ser anunciado ainda hoje, apesar de não ser uma certeza devido à recente queda da cotação internacional do petróleo, o que torna agora a gasolina no Exterior mais barata do que no Brasil. Os passos seguintes, para 2015, devem incluir um forte ajuste fiscal, com aumento de impostos e corte de despesas, considerado prioridade pelo economista-chefe do Banco Cooperativo Sicredi, Alexandre Barbosa.
– Hoje, o que está mais desequilibrado é a questão fiscal. Segurar gastos pode até ajudar no trabalho do BC, que não precisaria aumentar muito o juro – diz Barbosa.
Embora o corte de gastos também possa atingir o custeio, é unanimidade entre especialistas que a tesoura deve pegar principalmente os investimentos, tornando ainda mais remota a possibilidade de uma reação mais robusta da economia.
EFEITO IMEDIATO |
-A alta inesperada do juro básico causou efeito positivo no mercado financeiro. |
-Com destaque para as ações de bancos, a Bovespa subiu 2,52%. |
-O dólar recuou para R$ 2,4079. Foi a maior queda diária desde setembro do ano passado. |
O CENÁRIO DESAFIADOR |
POR QUE O GOVERNO SUBIU O JURO? |
-A avaliação de especialistas é que a alta de 11% para 11,25% ao ano significa que o BC deu o braço a torcer em relação à inflação. Também é um movimento que tenta passar para o mercado a impressão de que o segundo mandato de Dilma terá política econômica mais austera. E juro maior atrai mais dólares para o país e freia a alta da moeda americana, ajudando a segurar a inflação. |
A SELIC VAI CONTINUAR SUBINDO? |
-A expectativa é de que sim, com o ciclo possa ser encerrado com o juro em torno de 12%. Isso porque a inflação vai continuar pressionada por preços hoje represados: combustíveis, tarifas de transporte público e energia. O dólar alto é outro complicador. Até setembro, o aumento da inflação em 12 meses é de 6,75%, acima do teto da meta. |
QUE NOVAS MEDIDAS O GOVERNO PODE ANUNCIAR NESTE ANO? |
-Na tentativa de resgatar a confiança, é esperada a confirmação dos nomes da futura equipe econômica, o que pode ajudar a reconquistar o mercado, dependendo do perfil. Outra possibilidade é um reajuste da gasolina, que pode ser anunciado hoje – mas há o risco de pressão ainda maior na inflação. |
QUAIS INICIATIVAS SÃO ESPERADAS PARA 2015? |
-Pelo lado da despesa, são esperados cortes, tanto nos investimentos quanto no custeio da máquina pública. Em relação à receita, é possível que o governo volte a cobrar a Contribuição de Intervenção sobre o Domínio Econômico (Cide) nos combustíveis e retire incentivos tributários como a desoneração de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). |
POR QUE É NECESSÁRIO O AJUSTE? |
-A postura mais austera teria o objetivo de melhorar as contas públicas e tentar alcançar um maior superávit primário (poupança para pagar juros). Caso contrário, existe o risco de o país ver rebaixada a sua nota de risco de crédito pelas agências de classificação. |