ARTIGOS
por Paulo Brossard*
Em dias da semana finda, esta folha estampou notícia que não era ignorada, mas chamou a atenção por seu conteúdo. Tratava-se da taxa dos juros cobrados pela generalidade dos bancos, que chega ao inacreditável, o cartão de crédito e o cheque especial, em regra, envolvendo pessoas de patrimônio modesto. Em se tratando do cartão de crédito, o juro chega a 280% ao ano. Duzentos e oitenta por cento ao ano, por incrível que possa parecer. O cheque especial se aproxima da hipótese anterior, o juro anual chega a 256%.
Alega-se que ambas as modalidades são destinadas a emergências graves e urgentes e ainda pela acentuada inadimplência; sob essa inspiração evangélica, os bancos esquartejam as pessoas que, por esta ou aquela razão, caem em suas malhas, das quais só conseguem escapar, quando conseguem, mediante esforços gigantescos.
(Fora desses dois casos extraordinários, existe outro que merece ser registrado, embora de outro tipo. Se uma pessoa tiver R$ 500 mil em depósito, o banco lhe concede a remuneração anual de 0,9% de juro ou que outro nome tenha. Se ela vier a necessitar de R$ 100 mil e não quiser dispor da soma depositada, preferindo captá-la junto ao mesmo banco, pagará 10% ao mês, um pouco mais. Uma pequena diferença, como se vê...)
Fecho o parêntese e volto ao cartão de crédito e ao cheque especial, ambos de largo curso entre nós. Pois bem, o juro cobrado pelos bancos em geral, uns mais do que outros, vê-se que à luz do sol isto vem ocorrendo e não é de hoje. Ora, juros como esses são insuportáveis porque são impagáveis e são impagáveis porque não há atividade econômica lícita que os suportem; se houver, onde se processam suas milagrosas atividades? Qual o seu CGC ou CPF?
O Banco Central nada faz ou o que faz, em relação aos juros espantosos cobrados e confessados, pois noticiados nos próprios extratos das contas bancárias extraídos pelos bancos aos seus clientes e a ele compete regular os juros? A Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor terá tomado alguma providência? Não faltará quem diga que não é significativa a faixa humana que se serve do veneno da usura bancária, no entanto, não sei se é grande ou não, a meu juízo, basta que exista.
Dir-se-á que ambas as modalidades são facilidades que os bancos oferecem a seus clientes, a partir desse ponto os caminhos se bipartem; se as regras dos contratos forem cumpridas nos prazos e condições estabelecidas, torna-se uma real facilidade, caso contrário, se o cliente cair na malha sinistra da “Medusa bancária”, é transformado em presa a vida inteira à mercê de seu insaciável credor, uma vez que esses juros, ou metade que fossem, seriam impagáveis a um pobre mortal.
Não me parece impróprio relembrar que entre as atribuições do Banco Central está a de regular a taxa de juros, como se lê na lei que o criou. A notícia que se tem é que os bancos devem informar ao Banco Central os juros cobrados, que nada fez até hoje da informação privilegiada que possui regularmente. Esse dado torna mais estranha a sua posição, que sabe do que ocorre, mas permanece dormente. Afinal, sabe para quê?
O Ministério Público, que tantas atribuições possui, não estará qualificado para quebrar essa inação granítica?
Nunca antes na história deste país (como gosta de dizer o presidente Luiz Inácio), os bancos ganharam tanto; parece até que eles são amigos do rei.
*JURISTA, MINISTRO APOSENTADO DO STF