OPINIÃO
Desejada por muitos industriais como alavanca da exportação e barreira protetora do mercado interno, a desvalorização do real é acima de tudo, neste momento, um fator de incerteza e de agitação financeira. Quando o câmbio se acomodar, ninguém sabe onde, será possível um balanço mais claro dos ganhos e perdas. O País poderá estar um pouco mais competitivo, pelo menos por algum tempo, mas as pressões inflacionárias terão aumentado. Problemas de custos serão mais graves tanto para produtores como para consumidores. Mas a instabilidade cambial ainda poderá durar meses. A insegurança continuará, com intensidade variável, mas sempre com estragos, enquanto se esperam as prometidas alterações na política americana de afrouxamento monetário.
Alguma nova indicação sobre a mudança poderá surgir hoje, com a divulgação da ata da última reunião do comitê de política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). A emissão de dólares deve ser reduzida quando os dirigentes do Fed julgarem bastante firme a recuperação econômica dos Estados Unidos. Ninguém pode dizer com certeza quando isso ocorrerá.
Enquanto a agitação continua, as autoridades brasileiras tentam, em primeiro lugar, conter a excessiva instabilidade do câmbio e limitar seus efeitos sobre a inflação, ainda muito longe da meta de 4,5%. O governo tenta evitar um novo estouro do limite de tolerância, de 6,5%.
Da perspectiva do Palácio do Planalto, é muito importante conter, em primeiro lugar como estratégia eleitoral, a crise de confiança em relação à política econômica e às perspectivas da economia. A alta de preços é um dos principais fatores de desconfiança dos investidores e o Executivo sabe disso, embora continue pouco disposto a adotar uma política séria de estabilização. Isso envolveria, entre outros pontos, um controle efetivo dos gastos públicos.
Com reservas na vizinhança de US$ 370 bilhões, o Banco Central (BC) tem bom estoque de munição para intervir no mercado, mas, como sempre, com resultado muito incerto. No fim das negociações de ontem, o dólar comercial era vendido a R$ 2,394. Depois de dois leilões promovidos pelo BC com oferta de US$ 4 bilhões, a cotação havia caído para R$ 2,396, voltado a R$ 2,40 e novamente baixado. No fechamento do dia anterior, a moeda americana havia sido vendida a R$ 2,414. Mesmo com algum recuo, o dólar ainda acumulava ontem uma alta considerável, cerca de 7% em apenas 30 dias.
Apesar da depreciação do real neste ano e mesmo nos últimos 12 meses, as contas externas continuaram em deterioração. De janeiro até a terceira semana de agosto, o País acumulou um déficit de US$ 4,731 bilhões no comércio de mercadorias. As exportações renderam US$ 146,693 bilhões e as importações custaram US$ 151,424 bilhões. Pela média dos dias úteis, o valor exportado foi 1,6% menor que o de igual período do ano anterior. O valor importado, 10,4% maior.
O descompasso é indisfarçável. Parte das importações de combustíveis do ano passado só foi contabilizada em 2013 e isso afetou o resultado geral. Mas, se esse valor tivesse entrado nas contas de 2012, o superávit do ano teria sido muito menor. De qualquer forma, a piora do comércio exterior do País estaria bem caracterizada.
Para este ano, especialistas consultados no fim da semana passada pelo BC, em sua pesquisa Focus, projetam saldo comercial de US$ 4,35 bilhões, 77,6% menor que o de 2012. Essa é a mediana das estimativas coletadas pelos pesquisadores. O mesmo levantamento indica a expectativa de um déficit de US$ 77 bilhões na conta corrente do balanço de pagamentos.
A firme deterioração dessas contas é um dos fatores de insegurança dos investidores financeiros e dos empresários industriais. Com a esperada mudança no mercado financeiro - dólares mais escassos e mais caros -, especialistas mostram-se preocupados com o financiamento das contas externas brasileiras. Somem-se a isso a desconfiança em relação às contas públicas e o temor de mais inflação e o quadro torna-se facilmente compreensível. A mudança na política do Fed é só um componente a mais de um cenário ruim.
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