ZERO HORA 08 de fevereiro de 2015 | N° 18067
CADU CALDAS
INFLAÇÃO NO SUPERMERCADO. MENOS POR (BEM) MAIS
ESTÁ CARO VIVER. A hora em que o consumidor mais sente é quando vai comprar alimentos como carne e batata, cujos preços sobem a cada semana
O salto da inflação verificado pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – 1,24% em janeiro na comparação com dezembro, maior resultado para um mês desde fevereiro de 2003 – atestou o que consumidores já vinham percebendo nos últimos meses: viver está bem mais caro. Um dos vilões é justamente aquele grupo de consumo que as famílias têm que encarar diariamente, os alimentos.
E, desta vez, não adianta culpar o tomate. O papel de protagonista da inflação cabe só em parte a ele. Junto com o fruto vermelho, batata, arroz e carne formam a quadrilha do preço alto em 2015. Os quatro alimentos, tão populares na mesa dos gaúchos, têm ficado mais caros a cada semana, e a alta deve continuar nos próximos meses.
Diferentemente de 2014, quando o clima destruiu boa parte da produção agrícola, diminuindo a oferta de alimentos, este ano o aumento de preços é reflexo de uma série de fatores. A seca em São Paulo influencia, mas o aumento nos combustíveis e na energia e até a alta do dólar também são cúmplices.
Uma cesta de produtos – ideal para uma família de quatro pessoas se alimentar de forma saudável por uma semana – criada por ZH com a ajuda da nutricionista e professora da Pontifícia Universidade Católica (PUCRS) Carla Piovesan serve de termômetro para verificar o aumento nas gôndolas. Hoje, a lista de 26 itens custa R$ 284,41, um valor 61% mais salgado do que cinco anos antes, quando o mesmo cardápio saía por R$ 176,55. É como se, de 2010 a 2015, os consumidores perdessem quase 40% do poder de compra que tinham.
Levantamento realizado pelo Centro de Estudos e Pesquisas Econômicas (Iepe) indica que em janeiro os preços pisaram forte no acelerador. O índice de Preços ao Consumidor mostrou variação de 1,99% só no mês passado. Alimentos in natura, como frutas, verduras e legumes, subiram ainda mais, 3,16%. Mas nada se compara ao comportamento da batata inglesa, que disparou 47,03%. Em outubro, o quilo valia R$ 1,78. Agora, não sai por menos de R$ 3,52.
– Os preços dos alimentos não são causa da inflação, mas sim consequência. A comida não é vilã, é vítima. Ela reflete, entre outras coisas, o aumento do custo de irrigação com a alta de energia e do custo do frete com a alta do diesel – explica Antônio da Luz, economista da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul).
Para fugir do aumento generalizado, não há muita alternativa: diminuir o consumo ou substituir um alimento por outro. A nutricionista Carla Piovesan ressalta um detalhe que considera importante: comer em casa.
– É a melhor maneira de economizar e ter alimentação saudável. Vale até fazer marmita – brinca.
A seca no Sudeste vai afetar as prateleiras gaúchas com ainda mais força nos próximos meses. Com a limitação de uso de água para irrigação, imposta pelo governo, a produção de alimentos sentirá impactos. Nos meses de verão, o Rio Grande do Sul é praticamente autossuficiente no cultivo de hortifrúti, mas no inverno a dependência de São Paulo e Minas Gerais é forte, alerta Amauri Pereira, da gerência técnica da Ceasa. Culturas que necessitam de muita água devem apresentar o maior aumento de custo e também de preços: arroz, batata e tomate. O consultor agrônomo Carlos Cogo estima:
– Será um aumento gradativo ao longo de todo 2015, até chegar no pico em 2016.
A soja deve causar impacto no preço da carne. Como o farelo do grão é utilizado para ração de animais, a venda do produto para o Exterior – reflexo do dólar mais alto – encarece os custos de produção dos pecuaristas brasileiros.
– Além da dificuldade de escassez de água, o câmbio estimula a exportação, diminuindo a oferta dentro do país – lembra Farias Toigo, analista de mercado da Capital Corretora.
Outros produtos e serviços do dia a dia ficarão mais caros, aponta Marcelo Portugal, professor de Economia da UFRGS:
– Fevereiro terá todo o peso do ajuste na gasolina, nas mensalidades escolares e na tarifa de ônibus. Isso causará efeito cascata nos meses seguintes. O refresco deve ficar para o segundo semestre. Ainda assim, a projeção é de uma inflação acima do teto da meta (6,5%) para 2015.
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