O GLOBO, 18/07/2013
Cora Rónai
É ridículo ir à maior cidade do mundo, ao grande entreposto comercial do planeta, e voltar com a mala cheia de banalidades
Pronto: fui num pé, voltei no outro. Vi as modas, comi mais do que devia, gastei um caminhão de dinheiro e, como sempre, morri de ódio do governo brasileiro, que determina a prioridade das minhas compras no exterior. Não pelo que posso ou não posso trazer, mas por tornar tudo tão absurdamente caro no Brasil que me pego — como todos nós nos pegamos — comprando itens banais que não deveriam fazer parte das compras de viagem de ninguém.
Quando cheguei a Nova York, há uma semana, uma pilha de caixotes já me esperava no hotel. Eram roupinhas e brinquedos para os meus netos. Reclamei com a Bia de um navio pirata que ocupou meia mala e que ameacei deixar de presente para a camareira: por que ela não comprou aquele trambolho no Rio?
— Esse navio custa quase R$ 400 aqui, mãe; aí, não chegou a US$ 40, com frete incluído!
Meia mala ou não meia mala, é claro que o navio veio. A mesma diferença de preço se aplicava a cada um dos outros itens, dos bonecos às fantasias, passando pelos tênis e pelas espadinhas e lanternas que fazem conjunto com o navio.
Essa mesma lógica perversa se aplica a tudo de que um ser humano precisa, de bolsas, jeans, roupa de cama e óculos a sapatos, cosméticos e temperos.
(Tudo, mas tudo mesmo, está mais barato em Nova York do que no Rio. Até os hotéis, que antigamente custavam duas ou três vezes o preço dos nossos, estão mais ou menos iguais, com a diferença que o número de estrelas na hotelaria de lá é levado a sério.)
Alguns vendedores, que ainda estranham que alguém em viagem entre numa loja e peça quatro pares de tênis, me perguntaram se era verdade o que os turistas brasileiros andavam contando a respeito dos preços no país. Numa das lojas, me dei ao trabalho de procurar no celular alguns exemplos dos nossos preços para o vendedor incrédulo.
— Mas vocês pagam tudo isso?!
Pois é, pagamos, otários que somos. Eu, por exemplo, sou refém de uma loja chamada Rudge, a única que conheço, no Brasil, que percebeu que senhoras gordinhas que não querem se vestir como garotas de 25 também têm direito a roupas bem transadas. A Rudge se lembra do que estava na moda quando tínhamos 20 anos e tem uma leve pegada étnica, um jeito late hippie de ser. Suas roupas são mais originais e bonitas do que propriamente bem acabadas, mas isso não impede que os preços desafiem a imaginação. Pois numa ótima loja americana chamada Chico’s, que apesar do nome ridículo destina-se à mesma clientela, comprei uma túnica, uma calça, uma camiseta e um colar lindo pelo preço de uma única veste na Rudge. É como o navio pirata do Fabinho: dá para não trazer?
É ridículo ir à maior cidade do mundo, ao grande entreposto comercial do planeta, onde se encontra o melhor de cada nação da Terra, e voltar com a mala cheia de banalidades que, num país com impostos menos ofensivos, poderíamos comprar na esquina, sem precisar parcelar em dez vezes.
O precioso espaço de bagagem que deveria ser usado para que trouxéssemos peças únicas da África, objetos de design da península escandinava, tecidos indianos e tesouros variados vem ocupado por brinquedos de plástico, roupas para o dia a dia, calçados diversos.
O pior é que, para sustentar sua cáfila de ministros e o maior contingente de cargos de confiança desta e de qualquer galáxia conhecida, dona Dilma ainda vira sócia da economia que fazemos em dólares, e tunga o que gastamos no cartão em 6%.
Quando passei pela alfândega, a agente olhou para as minhas duas malas imensas e perguntou se eu tinha algo a declarar. Não, respondi — com toda a sinceridade: apenas netos gêmeos e um manequim que a moda brasileira ignora. A agente revirou os olhos, como quem diz “sei bem o que é isso”, e me deixou passar. Agradeço de coração a essa moça compreensiva. Tirando um mini iPad, eu não trouxe nada com tomada, mas se abrisse aquelas malas nunca mais conseguiria fechá-las.
E não é que os americanos inventaram uma variante do golpe do sequestro por telefone? Funciona assim: uma pessoa que se diz gerente do hotel liga para o quarto do hóspede e diz que o seu cartão de crédito não passou direito na máquina, ou não foi aceito pela operadora. Quando o hóspede se prontifica a descer para resolver o problema, o falso gerente diz que não é necessário, e que basta dar o número do cartão novamente, pelo telefone. Muita gente tem caído no golpe — e, quando volta para casa, tem a desagradável surpresa de receber a cobrança de compras que nunca fez.
Como diz o Ancelmo, deve ser terrível... vocês sabem.
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