PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA TRIBUTÁRIA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL - Art.150, § 5º - A lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

PAGA-SE ATÉ O DOBRO POR PRODUTO INFANTIL


Consumidor paga até o dobro por produto infantil no Brasil. Especialistas culpam impostos e apelo emocional da compra pela disparidade de preços - Luciana Casemiro e Clarice Spitz - O GLOBO, 16/02/12 - 9h52


RIO — Quem está fazendo o enxoval do bebê ou tem crianças em casa sabe o peso desses pequenos no orçamento doméstico. A comparação entre preços gigantes e quantidades reduzidas de matéria-prima usada na produção dos itens — tradicionalmente roupas infantis custam mais que roupas de adultos—assustam. Essas diferenças se tornam ainda mais gritantes quando comparados os preços de produtos vendidos aqui a similares no exterior. Um carrinho de bebê, por exemplo, sai por menos da metade do preço fora das fronteiras brasileiras e brinquedos da moda podem ser encontrados por um terço do valor.

Quando o assunto é roupa e sapatos infantis a discrepância costuma ser ainda maior: enquanto um pacote com sete bodies para bebê custa US$ 19,99 (o que equivale a R$ 34,44), numa rede de varejo americana, aqui se paga, em média, mais de R$ 20 por uma única peça. Para reduzir a despesa, muitos brasileiros passaram a fazer suas compras no exterior. Não se trata de esnobismo, mas de aproveitar o câmbio favorável e o farto crédito para turismo para transformar um momento de lazer em uma oportunidade de economia. O tamanho do apetite por ofertas fora das fronteiras pode ser medido pelo gasto de brasileiros no exterior que no ano passado bateu recorde, dando um salto de quase 30%, para um volume total de R$ 22,1 bilhões.

Fabricantes brasileiros dizem que câmbio, tributo e custo da mão de obra encarecem produtos.

As associações brasileiras das indústrias têxtil (Abit) e de brinquedos (Abrinq) reconhecem que, na média, roupas e brinquedos comprados no exterior custam 40% a menos do que similares nacionais. Segundo os fabricantes, o custo indireto de mão de obra, a incidência de impostos e o custo do dinheiro (a elevada taxa de juros) seriam os principais responsáveis pela disparidade.

Vicente Donine, vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), lembra que boa parte dos produtos comercializados em Nova York e na Flórida tem origem asiática:

— E não estou me referindo à Ásia para falar de problemas de qualidade, mas da questão da formação do preço. Da porta da fábrica para dentro, nossos produtos têm valores muito competitivos com os produzidos no continente asiático. No entanto, o encargo social sobre a hora trabalhada, que chega a 106% do salário, e a carga tributária elevada pesam sobre o nosso custo. Sem falar no preço da energia — terceiro maior custo da indústria — que só perde para a Itália comparada a todo o mundo — enumera Donine.

O economista Nelson de Sousa, do Ibmec, defende que o Brasil reveja com urgência a sua carga tributária:

— Enquanto o Brasil não fizer uma arrumação na carga tributária, vamos continuar patinando e os chineses são pesos pesados.

Synésio Batista, presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), ressalta ainda que o câmbio valorizado dá ao importador outra vantagem comparativa. Segundo ele, são os importados, sobretudo os produtos chineses, que dominam o mercado a uma proporção que fechou 2011 de 70% para os importados, contra 30% dos nacionais, o ano mais amargo em muito tempo. Em 1995, conta, o cenário era outro, favorável à indústria nacional, que dominava que detinha 98% do mercado.

— O Brasil hoje oferece vantagens, mas para a importação — afirma.

Tradutora faz até óculos para filhos no exterior

Justificativas à parte, quem tem a possibilidade de fazer as suas compras no exterior não quer outra vida. O casal Renata e Cid Valério, por exemplo, aproveita as viagens anuais aos Estados Unidos para renovar o guarda-roupa da família, principalmente, dos pequenos. Até óculos da filha foi feito no exterior: aqui apenas pela armação ela pagaria R$ 600, lá o mesmo modelo, incluindo lentes finas e antireflexo, custou a ela US$ 300 (R$ 516,90). Pelas contas de Cid, cada mil reais gastos em compras no exterior, saíriam por R$ 1.700 por aqui.

— Economizamos cerca de 70%.

Renata se diz afrontada com os preços cobrados no Brasil:

— O modelo mais incrementado de Beyblade que comprei para o meu filho custou US$ 9,99 (R$ 17,21). Aqui o mesmo brinquedo custa entre R$ 59 e R$ 79. Aqui um jogo de Playstation 3 custa cerca de R$ 150, lá o mais caro custa US$ 49, ou seja, menos de R$ 100. Fora isso, algumas grandes redes já convertem a compra em reais, o que isenta o pagamento do imposto — conta Renata que aproveita as viagens para renovar ainda o estoque de protetor solar e de xampu.

Para o coordenador de varejo da FGV, Sergio Goldberg, em produtos relacionados a crianças pesa ainda um fator emocional que influencia a decisão de compra e atrai a atenção de empresários:

— Embora o custo seja menor do que as roupas de adultos em termos de insumos e de mão de obra, existe a percepção do apelo lúdico por parte dos empresários. Eles acham que a roupa pode ser mais cara e ainda assim o consumidor vai pagar. Você pode deixar de comprar roupa para você mesmo porque achou caro, mas não para o filho porque queremos sempre o melhor para nossos filhos – afirma Goldberg.

Ele mesmo diz que vai duas vezes por ano para os EUA para fazer o enxoval da família. Entre os fatores que contribuem para o encarecimento da roupa infantil no Brasil frente ao que é comercializado lá fora, ele destaca: o custo Brasil (onde estão os impostos) e o câmbio.

— Com a apreciação do real frente ao dólar, o custo no Brasil ficou ainda mais caro e isso mostra claramente as mazelas do varejo brasileiro. As disparidades no segmento de roupas são maiores que nos outros segmentos em geral porque a nossa mão de obra não é qualificada e nem é tão barata quanto se pensa e pela nossa baixa produtividade. No setor de roupa é mais gritante também porque roupas têm necessidade e desejo — vaticina o coordenador de varejo da FGV.

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