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quinta-feira, 20 de março de 2014

HÁ UMA BOLHA IMOBILIÁRIA NO BRASIL? SIM


FOLHA.COM, 15/03/2014 03h00


WILLIAM EID JUNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA



ROBERT SHILLER ERROU?


Há quase dois anos, publiquei nesta seção o artigo"Nelson Rodrigues, seu consultor imobiliário". Nele defendi a existência de uma bolha imobiliária no país.

Mostrei que a renda não acompanhou a valorização dos imóveis, que os aluguéis não remuneravam adequadamente o investimento em imóveis e que o custo de produção não justificava os preços elevados.

Destaquei, sobretudo, a questão da informação enviesada. Quem fornece dados sobre o mercado é parte interessada –os vendedores de imóveis. E, é claro, a mensagem sempre será otimista. As bolhas, observei, não precisam necessariamente estourar, pois os preços podem se ajustar lentamente, desde que não haja gatilhos. Alguma coisa mudou nesses dois anos?

O prêmio Nobel de Economia Robert Shiller esteve no país e afirmou que havia uma bolha imobiliária. Foi ele quem previu as bolhas de 2001 e 2007 nos Estados Unidos. O professor da Universidade de Yale apontou a alta valorização dos imóveis, somada à inexistência de uma explosão de crescimento, como indicador da existência da bolha no país.

Para Shiller, as bolhas são um tipo de epidemia social na qual as pessoas se movem pelo entusiasmo generalizado com supostas oportunidades de ganhar dinheiro. Só esse tipo de comportamento pode explicar, por exemplo, o preço atual de pequenos apartamentos no Rio de Janeiro, cujo metro quadrado pode ultrapassar R$ 40 mil. Isso significa que o aluguel mensal de um apartamento de 200 m2 deveria estar por volta de R$ 48 mil, imaginando uma remuneração de 0,6% sobre o valor do imóvel, prática usual no mercado. Alguém paga?

Mas o que mais mudou? A composição do mercado. Entre 2006 e 2008, os apartamentos pequenos, de um dormitório, respondiam por uma parcela pequena das vendas de imóveis no país, segundo o Secovi (o sindicato do mercado imobiliário) –algo entre 6% e 23% do total de apartamentos grandes, de quatro dormitórios.

Hoje acontece o oposto. As vendas dos grandes representaram 30% das vendas dos pequenos em 2013. Essa tendência indica que o modelo se esgotou. Não há renda para comprar imóveis grandes e, portanto, os preços começam a se estagnar.

Os índices imobiliários disponíveis não são bons indicadores. Alguns usam preços anunciados, que, como sabemos, são muito diferentes dos praticados. Outros usam valores de garantias dadas em financiamentos. Outros ainda usam imóveis dos fundos de pensão.

De toda forma, o índice do Banco Central do Brasil de imóveis, que usa valores de garantias, apresentou uma valorização de 8,3% em 2013. Descontada a inflação, sobra pouco mais de 2% de valorização para o proprietário do imóvel. Se descontarmos custos de manutenção e a comissão de vendas, vemos que o resultado líquido para quem comprou um imóvel no início de 2013 e o vendeu no final do ano foi negativo.

Com a estagnação dos preços nominais, e essa tendência é nítida, a inflação faz o trabalho de desmonte da bolha. Se o preço nominal em um ano permanece o mesmo, dando a ilusão de um volume de riqueza estável, a inflação levou embora 6% do seu patrimônio. Em três anos, isso vai significar quase 20% de perdas. Em cinco anos, quase 35%.

Pior, com a economia andando de lado como está e com perspectivas não muito animadoras, esse processo vai se acentuar. As incorporadoras e construtoras já sentem os efeitos do final do processo. O número de lançamentos caiu. O volume de imóveis comerciais vazios, incluindo shoppings, é enorme.

Dois anos depois, não discutimos mais a existência de uma bolha. Acompanhamos o seu desmonte.



WILLIAM EID JUNIOR, 57, é professor titular e coordenador do Centro de Estudos em Finanças da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas

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